1 de nov. de 2016

A Inteligência Pessoal do professor como requisito essencial para sua prática profissional

No Seminário para Educadores, Desafios da Contemporaneidade, Julio Furtado propõe aspectos favorecedores da prática profissional do professor, a partir da análise de fatores que dificultam o seu fazer pedagógico vivenciado todos os dias.

Para integrar características que possibilitem um fazer pedagógico mais eficiente o autor defende que o educador deve agregar atitudes que juntas compõem uma inteligência pessoal capaz de tornar a prática educativa mais viva e significativa, integrando os objetivos de aprendizagem necessários com os atores educacionais - escola, família e alunos.

Para o pensador e estudioso da educação, a inteligência pessoal é composta de vinculação afetiva, elementos culturais, olhar inclusivo e postura apreciativa. Sem algum destes elementos a prática do professor torna-se esvaziada e destituída de sentido.

Refletindo sobre as características elencadas aproveito para extrapolar o conceito de vínculo afetivo como algo que ultrapassa a relação professor aluno, mas reside em todo ato de educar e compreender o processo educacional, como escolha de ser educador e a identidade docente que deve ser compreendida por meio de perguntas como:

- Qual o vinculo que estabeleço com a minha profissão?
- Por que escolhi ser educador?
- O que sustenta a minha prática?
- Por que me mantenho nela?

Outro fator trazido por Furtado em sua palestra diz respeito a Cultura e quando falo de Cultura tenho que entender que somos seres individuais que nascem em uma dada sociedade, em uma época específica, sendo composto por ela e tendo o poder de transformar e manter aspectos que perpassam o meio social, natural que me constituem e para isso há que se ter problemas, desafios e dúvidas que me façam criticar e formar concepções com as quais me filio, mas que também me distancio com escuta livre para formar e propor novas teorias e transformações.

Mais uma ideia que amplio trazida pelo autor é quanto a característica do olhar inclusivo.
Nosso raciocínio e a forma de organizar ideias e pensamentos é logico-matemática. Para construir o conhecimento generalizamos e abstraímos, trazemos para a internalização quando os aspectos apresentados e vivenciados atingem o nosso campo de sentidos.

O sentido é anterior e posterior ao significado, já temos - mesmo uma criança - pré-noções - e mesmo quando o significado é apresentado e entendido dentro da sua construção social ele não se restringe ao que foi estabelecido pela cultura, pois o sujeito opera com suas construções e re-construções trazendo novos e inesgotáveis sentidos, daí a (re)significação das coisas e do mundo.

Diante de qualquer situação ou sujeito que me traz a marca do diferente ou da diferenciação tendo, como sujeito cognoscente, a classificar. A importância se dá em ultrapassar a classificação, não negá-la, pois esta é importante para um ponto de partida. 

Ultrapasso a categorização por meio da compreensão, contextualização, ética, antítese e síntese.

Preciso entender que existem agrupamentos mas em todo agrupamento há diferenciações e que estas são necessárias para o crescimento. Aprendemos com a diferença, ampliamos o olhar. O igual nos fortalece, o diferente nos ultrapassa, instiga e faz crescer.

Toda experiência humana transita nas identificações e diferenciações, mas o olhar separatista não aceita as diferenças, enquanto o olhar inclusivo considera, aprende com ela e promove transformações em todos os envolvidos. O olhar inclusivo é o olhar do que acredita, potencializa e liberta.

A postura apreciativa pode ser ilustrada pelo olhar contemplativo, do artista ou do apreciador de arte que deixa-se sucumbir pela mais bela poesia existente no outro, seja em pensamentos, atitudes, discurso, fazeres.

Reconhecer que o outro é uma obra de arte e que serve para ser apreciado é despertar nele a apreciação, o deleite e amor pelo conhecimento construído e reconstruído a todo instante.

É o que o autor traz como : "Se podes olhar vê, se podes ver repara".  Em cada uma destas óticas o olho assume uma função. O olhar é o olho que visualiza, o ver é estar para além do olhar, há um destaque no ver e o reparar é o olho minucioso que se debruça em uma investigação ainda mais minuciosa.

Nós educadores temos que reparar. Cada sujeito com o qual trabalhamos é único e, portanto, cheio de pistas para que nós possamos aprender a ensiná-lo. Se reparamos ele dirá o caminho que devemos percorrer para tanto.

Uma outra citação que o autor faz uso e toma emprestada de Paulo Leminski:

"Vai me ver com outros olhos ou com os olhos dos outros?"

Nós precisamos ultrapassar o olhar social e individual de outras pessoas e nossa própria forma de olhar para que o outro possa ser uma fonte inesgotável de descobertas e de possibilidades e não de estancamentos. Para isso Furtado conclui que o professor precisa pegar os olhos dos alunos emprestados.

Ver por meio do aluno significa se autoavaliar. Ver com os olhos do aluno significa seguir as pistas que ele dá para o seu próprio processo sobre o qual ele sabe muito mais do que eu. Para isso o autor sustenta a necessidade do amor pedagógico que é aquele em que o educador acredita, torce e aceita (acolhe).

Importante destacar que o acolher não significa concordar, significa reconhecer que o outro é um ser que merece total respeito, mesmo que eu discorde dele. 

Nas interfaces de aprendizagem em que há o professor e alunos existem três tipos de mediação : relacional, cognitiva e de aprendizagem. Estabeleci, nestes campos trazidos por Furtado uma correspondência com o que trago na minha dissertação do mestrado quando utilizo as categorias de Zabala relacionando-as a mediação - Atitudinal - o que ele traz como relacional, Conceitual que ele traz como cognitiva e  procedimental que ele traz como didática.

Os saberes são pensados em lugares diferentes trazendo pontos convergentes o que reflete o período em que estamos vivendo historicamente em que urge uma atenção para o sentir, para o ser , para o fazer significativo para todos os envolvidos.

Expõe que a gestão da conduta é resultante da combinação de três fatores: atitudes docentes, poder e visão da indisciplina. A visão da indisciplina que o professor tem vai gerar suas atitudes docentes e ambas estão relacionadas a sua compreensão sobre o poder.

Para John Galbraith, o poder passa por três fases históricas bem demarcadas e ainda hoje se sustenta nestas três, embora socialmente seja defendido sobre o prisma mais atual.

A primeira perspectiva de poder é chamada pelo autor de poder condigno e está relacionado ao poder de punição.
A segunda forma é o poder compensatório que tá articulado com as trocas e barganhas... ex. vc faz isso em troca de...
E o terceiro poder, mais defendido nos dias atuais e mais lógico, embora nem sempre utilizado,é o poder condicional. Este está alicerçado no poder pelo convencimento.

Ora, se o sujeito tem uma visão de mundo hierárquica, não conseguirá ter atitudes democráticas, nem tampouco utilizar o poder de convencimento. Ao contrario, irá impôr a sua forma de pensar, o que não fará sentido algum para o outro.

Desta forma, a visão é preponderante sobre atitudes e sustentação de poder.

Furtado sustenta que as atitudes docentes são marcadas pelos seguintes fatores:

- medo
- desmotivação
- deserção -o famoso deixa para lá
- transferência - o problema é a família, é o sistema.. etc
- enfrentamento

Estes podem acontecer separadamente, simultaneamente ou com maior predominância de uns do que de outros, mas são características comuns nas atitudes educacionais e precisam ser vistas para serem enfrentadas, pois não há educação sem reflexão do professor sobre si e sobe o seu fazer.

Aponta para a visão tradicional da indisciplina extremamente comum ainda hoje  que gera atitudes de exclusão, violência, bullying, invisibilidade, indisciplina, vigilância, evitação, regras arbitrárias, delação, pressa e ignorância.

Essas atitudes, em nada, geram conhecimento, ao contrário, distanciam, já que o conhecimento só é internalizado quando passa pelos campos significativos do sujeito.

Na visão construtiva da indisciplina o comportamento do professor caminha em direção a aprendizagem, pois promove participação vendo o sujeito como parte do coletivo preservado em sua individualidade e construindo regras enquanto princípios. Trabalha na vertente do desenvolvimento, planejamento, autonomia e oportunidades.

Assim, refletindo sobre as proposições trazidas pelo palestrante percebo o quanto a educação tem que se voltar para inteligência pessoal dos educadores, o quanto ainda há pouco investimento em formações que fortaleçam a dimensão existencial do ser, fazer e existir.

Conceitos são fundamentais, mas as atitudes humanas só são de fato mexidas quando se trabalham as emoções e estas tem que ser destacadas em processos formativos, bem como devem ser levadas em conta na avaliação de cada aluno e autoavaliação os profissionais que estão inseridos no meio educacional.

Miliane Tahira



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